segunda-feira, 14 de maio de 2012

Gatilho Verbal

Foto: Jéssica Ueno
 [...] I – Ao menos essa máscara me aquece... (pensativo) Não sinto frio com ela. O frio não passa. Estou sempre protegido. Não tenho problema com o calor também. Ele não me incomoda. O frio sim. E é justamente dele que me protejo. Esse frio que às vezes é doce... Doce como chocolate... Também odeio chocolate. Pensando assim... (pensativo novamente) Não sou tão louco. Sou normal. Ou será que sou louco?

P – Você é louco! (explicou chegando em cena com seu caderninho novamente) Do contrário não estaria aqui e do contrário eu não teria emprego e do contrário não poderia ajudá-lo, pois do contrário eu não teria diploma!

I – E daí que você tem diploma?

P – Diploma é justamente o que me faz ter o direito de vir aqui julgá-lo como louco. Aliás... Preciso saber qual o seu problema... A razão de estar aqui.

I – Diga-me a razão de estar aqui.

P – Exatamente o que quero saber.

I – Não. Disse: Diga-me você (ênfase em você) a razão de estar aqui.

P – Eu?

I – Tem mais alguém aqui?

P – Você!

I – De fato.

P – Então!

I – Então?

P – Então quem tem que me dizer quem é você é você!

I – Prefiro que você diga quem é.

P – Mas eu sou o Psicólouco, não posso dizer quem sou, eu devo perguntar quem é você!

I – Há! (trinfante)

P – O quê?
I – Acabou de me dizer quem é. (ri)

P – O quê? Eu não... (percebe que disse) Oh! Que golpe baixo!

I – Obrigado.

P – Não se empolgue... Agora estou esperto! E sabe por quê? Porque tenho um diploma e isso significa que estudei, o que quer dizer que não sou um ignorante qualquer.

I – Um diploma não o impediu de cair no meu jogo na primeira vez...

P – Mas impedirá que caia na segunda...

I – Ah, então admite que caiu na primeira?

P – Sim, não tenho problemas com isso... Agora diga-me quem é?

I – Quem?

P – Você!

I – Se você é o Psicólouco, quem sou eu?

P – É o que quero saber...

I – Deveria saber já...

P – Qual seu nome?! (enfurecendo-se) Deve estar aqui na lista...

I – E o que sou para ter meu nome na sua lista?

P – Um paciente, é claro!

I – Há! (ri novamente)

P – O que foi?

I – Respondeu mais uma pergunta minha. Você é o Psicólouco e agora também disse que sou seu paciente.

P – (urrando de raiva) Estou ficando impaciente com você, paciente!

I – Por quê?

P – É obvio!

I – É?

P – Meu caro paciente. Se fico impaciente com um paciente deve-se calcular que há algo errado aqui, não acha?
I – Agora descobri que está impaciente com o paciente porque há algo errado!

P – (silêncio)

I – Há (vitorioso) [...]

Um comentário:

  1. Essa coisa de não querer falar quem somos e esperarmos que os outros respondam quem somos, me faz lembrar que um professor de filosofia nos disse uma vez.
    "nossos nomes são nossas máscaras"
    assim como Hagrid pergunta se Harry e um bruxo ele responte." So Harry, apenas Harry"

    ja no caso acima,o paciente sabia que era um paciente naquela situação, so nao sabia quem ele realmente era.


    parabéns pelo blog novo. :-)

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