segunda-feira, 11 de julho de 2016

Urgência em Significar

Foto: Divulgação/Whatsapp
 Se um dia eu acordar num país globalizado, onde o espaço de cada um tenha sido resumido a um quarto, não genuíno, pois ainda pertencerá a terceiros, eu vou precisar urgentemente significar. Vou querer ser um som no ar. Vou querer ser um glorioso manto. Vou precisar significar.

 Nesse mundo, vai haver uma mulher de chinelo embarcando no trem, e, assim que conseguir se sentar, ela vai tirar de sua bolsa um par de sapatos de salto alto, e fazer a substituição enquanto ainda há tempo. Também vão aparecer em todos os cantos pessoas entregando papéis, pedindo papéis, enrolando papéis e colando papéis. Esses papéis terão tomado conta de tudo nesse mundo.

 Eu terei urgência em significar. Vou querer não passar em branco. Vou querer ter relevo, mas não de corretivo. Vou querer ter relevo de certeza e profundidade. Vou precisar viver tateando a mim mesmo para me lembrar de quem sou ou de quem serei.

 Nesse mundo vai ter de tudo. Vai ter meninos que ajudam a mãe a carregar as compras de feira. E também vai ter os que roubam na feira para carregar até o caixão o corpo da mãe. Vai ter guerra entre as cores. Entre o branco e o preto, entre o verde, o amarelo e o vermelho. Até o azul vai brigar.

 Estarei dormindo de sorriso aberto, sem mais repressão. Estarei acordado de sorriso também aberto, mas com o maior esforço, sem exatidão. Tentarei guardar meu apocalipse, mas sei que não conseguirei bancar por muito tempo o tedioso santo. Vou querer significar.

 Listarei todos os dias o que gostaria de ser, mesmo sem ver como ser. Vou querer ser um recital para que alguém decore. Vou querer ser um esporte, para que alguém pratique. Vou querer ser uma cena, para que alguém assista. Mas eu mesmo não terei tempo para me apreciar, pois estarei servindo e não significando.

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